Porque será que a extrema direito brasileira oscila de modo tão oportunista? Que o diga Jair Bolsonaro, o ex-presidente que um dia se vestiu de paladino da moralidade, mas agora se vê em uma encruzilhada digna de um enredo shakespeariano. Ser ou não ser a favor da “Ficha Limpa”? A Lei, que ele mesmo apoiou em 2010, agora é vista por Bolsonaro como uma vilã, uma perseguidora insaciável dos “nobres” políticos de direita. Como diria o filósofo Kierkegaard, estamos diante de uma contradição que não poderia ser mais perfeita: o passado e o presente de um mesmo indivíduo se chocam em um espetáculo de hipocrisia.
A Lei da Ficha Limpa, resultado de um clamor popular por mais ética na política, estabeleceu critérios claros de inelegibilidade para aqueles que foram condenados por crimes graves. Foi uma resposta clara da sociedade cansada de ver seus representantes envolvidos em escândalos e corrupção. Na verdade, um grito que ecoou nas ruas, onde a população, em um ato de cidadania, exigiu transparência e moralidade. E quem diria que o mesmo Bolsonaro que levantava a bandeira da moralidade se tornaria um crítico feroz dessa conquista democrática quando se viu com sua ficha suja?
Agora, o ex-presidente, inelegível até 2030 por abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação, clama por uma revogação da lei que um dia ajudou a aprovar. Ele quer transformar a punição de oito anos em meros dois anos, como se o tempo de inelegibilidade fosse um mero detalhe, uma formalidade a ser ignorada em nome de seu projeto pessoal de voltar à presidência. É um retorno ao “sistema democrático” que ele tanto defende, mas que convenientemente se esquece de mencionar quando a lei lhe desfavorece.
Nesse teatro de absurdos, o novo presidente da Câmara, Hugo Motta, entra em cena como um coadjuvante que ecoa os apelos de Bolsonaro. Sua defesa de que oito anos é um tempo excessivo em um sistema democrático é uma ironia que não se pode ignorar. Afinal, em um país no qual a política é vista como uma eterna troca de favores e uma dança das cadeiras, o que realmente importa é o poder, e não a moralidade que se alega defender.
Assim, a Lei da Ficha Limpa, longe de ser uma ferramenta inútil, é um marco da vontade popular. Sua revogação não seria apenas um golpe na ética política, mas uma declaração de que a moralidade é um conceito maleável, dependente das conveniências de quem a invoca. A ironia desse momento é que, ao tentar se livrar de suas amarras, Bolsonaro não faz mais do que escancarar a farsa que sempre foi a política brasileira.
Em suma, o ex-presidente se vê agora em uma encruzilhada, na qual suas convicções se transformaram em mera retórica. O que resta são contradições de um personagem que tenta reinterpretar seu papel, esquecendo que as palmas do público podem se transformar em vaias quando a hipocrisia se torna evidente. E assim, seguimos assistindo a essa tragicomédia, na qual a moralidade é apenas um detalhe na busca insaciável pelo poder.