No início do ano, uma criança de 3 anos morreu em Jaguariúna (SP) após ser picada por um escorpião que estava dentro de sua galocha, mesmo após o cuidado dos pais em chacoalhar o calçado antes. O trágico acidente é mais um a sinalizar para um grande aumento de casos de envenenamento por escorpiões no Brasil.
“A real dimensão deste problema é provavelmente muito maior do que as estatísticas registradas sugerem”, diz o artigo publicado na Frontiers in Public Health. Baseado em um levantamento de dados de pesquisas recentes sobre o tema com hipóteses para causas e projeção para os próximos dez anos, Eliane Arantes (USP) e Manuela Pucca (Unesp) chamam atenção a essa possível crise de saúde pública pelo escorpionismo. De 2014 a 2023, os casos aumentaram em mais de 250% com 1.171.846 casos notificados no período, e as projeções indicam aumento contínuo, com estimativa de 2.095.146 casos até 2033.
Muito lesivo e perigoso para crianças, idosos e pessoas com comorbidades cardíacas, a mortalidade por volta de 0,06% pode subestimar a relevância do problema, conforme as pesquisadoras. Apesar disso, todos estão sujeitos ao encontro com um escorpião, pois eles vivem na rede de esgoto das cidades e isso não depende da higiene residencial das pessoas. “Nos últimos anos, o crescimento foi exponencial. É uma crise silenciosa, porque não está recebendo a atenção devida”, alega em entrevista ao Jornal da USP Manuela Pucca, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unesp.
Dentre as espécies, o gênero Tityus é o mais preocupante, destacando-se T. serrulatus, T. bahiensis, T. stigmurus e T. obscurus pela capacidade de causar significativo envenenamento. Com a rápida e desordenada urbanização, os encontros com eles se tornaram comuns devido ao acúmulo de lixo e ao saneamento inadequado. Além desses problemas, os aracnídeos podem sobreviver 400 dias sem alimento e são bem adaptados ao ambiente urbano quente e escuro nas redes de esgoto. Eles podem ser encontrados até em apartamentos muito altos por subir pelos canos; ainda, as mudanças climáticas, com verões mais quentes e períodos alternados de chuvas intensas e seca, facilitam a proliferação das populações das espécies.