CURIOSIDADE: 5 pontos para entender o lançamento de água da usina de Fukushima no oceano

O acidente na central nuclear japonesa de Fukushima Daiichi ocorreu na tarde de 11 de março de 2011, após a usina ser atingida por um tsunami de 15 metros causado por um terremoto. O tremor de magnitude 9 durou apenas 3 minutos, mas causou estragos imensuráveis.

De acordo com a Associação Nuclear Mundial, o terremoto ocorreu a 130 km da costa da cidade de Sendai, na província de Miyagi. O tsunami inundou cerca de 560 km² e matou aproximadamente 19,5 mil pessoas junto da atividade sísmica. O acontecimento interrompeu o fornecimento de energia e o resfriamento de três reatores de Fukushima Daiichi, liberando material radioativo.

Nesta quinta-feira (24), passados 12 anos após o desastre, o Japão começou a despejar a água residual tratada da usina nuclear no Oceano Pacífico, após aprovação da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) da ONU. Confira 5 pontos para entender essa decisão:

1. Por que o Japão decidiu liberar a água radioativa de Fukushima?

Segundo a agência France-Presse (AFP), o Japão decidiu em 2021, após anos de discussão, que lançaria no mar uma quantidade máxima de 500 mil litros de água radioativa por dia, usando um tubo de 1 km de comprimento. Isso porque não há mais espaço para a água poluída: aproximadamente 1,34 milhões de toneladas (quase 540 piscinas olímpicas) estão armazenadas em cerca de mil contentores de aço à beira-mar. Agora, não cabe mais.

O governo japonês e a Companhia de Energia Elétrica de Tóquio (Tepco) também afirmam que é preciso remover a água para evitar acidentes futuros, segundo o jornal O Globo.

Além disso, a AIEA publicou em 4 de julho um relatório sobre uma análise de segurança do líquido tratado pelo Sistema Avançado de Processamento de Líquidos (ALPS) da usina. A conclusão foi que a abordagem segue padrões de segurança internacionais. O documento observou ainda que as descargas “teriam um impacto radiológico insignificante nas pessoas e no ambiente”, segundo comunicado da AIEA.

2. Qual é o processo de tratamento da água de Fukushima?

A Tepco afirma que o sistema ALPS utiliza uma série de reações químicas para remover 62 radionuclídeos da água contaminada – incluindo césio e estrôncio. Uma exceção é o trítio, uma forma radioativa de hidrogênio que ocorre naturalmente e é produzida na atmosfera quando os raios cósmicos colidem com as moléculas do ar.

Conforme explica a AIEA, o trítio tem meia-vida radioativa de 12,32 anos. Isso significa que, para qualquer quantidade dele, apenas metade permanecerá após 12,32 anos, devido ao decaimento radioativo.

Já a meia-vida biológica da água tritiada no corpo humano é de 7 a 14 dias.

A água de Fukushima foi diluída para reduzir os níveis de radioatividade para 1.500 becquerels por litro (Bq/L), segundo a Tepco. Isso é abaixo do padrão de segurança no Japão, que é de 60.000 Bq/L.

3. Quão radioativa é a água de Fukushima?

Segundo a Comissão de Segurança Nuclear Canadense, o trítio pode ser radioativamente perigoso se inalado ou ingerido, podendo causar câncer. Porém, ele só é prejudicial aos seres humanos em doses muito grandes.

A Tepco garante que água armazenada na central nuclear de Fukushima Daiichi tem uma baixa concentração do elemento.

Existem tecnologias para recuperar o trítio só quando ele está altamente concentrado em pequenas quantidades de água – por exemplo, em instalações de fusão nuclear. “É tecnicamente muito difícil remover água tritiada da água”, justifica a companhia japonesa. “O trítio é um isótopo do hidrogênio, e a água contendo trítio tem características químicas quase idênticas às da água com hidrogênio comum.”

Tony Hooker, especialista nuclear da Universidade de Adelaide, na Austrália, também disse à AFP que o nível de trítio que será despejado no mar está bem abaixo do limite de água potável da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 10.000 Bq/L. “O trítio é regularmente liberado das instalações de energia nuclear para os cursos de água em todo o mundo”, disse Hooker. “Durante décadas, não houve nenhum efeito ambiental ou de saúde prejudicial evidente.”

4. Quem é contra a decisão de liberar a água radioativa de Fukushima?

De acordo com a rede BBC, quem mais criticou a decisão foi a China. O país asiático anunciou que sua proibição já existente sobre a importação de frutos-do-mar de Fukushima e de outras províncias próximas foi agora estendida a todas as mercadorias do setor vindas do Japão “para proteger a saúde dos consumidores chineses”.

Vendedores de frutos-do-mar em Pequim também se posicionaram contra despejar água radioativa no Pacífico. Horas antes do início do lançamento da água no mar, um gerente de loja chamado Wang Jinglong, num dos maiores mercados de frutos-do-mar da capital chinesa, declarou à AFP que já houve um “grande impacto” em seu negócio, especialmente nas vendas de atum.

“Costumávamos comprar peixe japonês fresco, mas devido a proibições alfandegárias, deixamos de recebê-lo há dois meses”, disse Wang, referindo-se aos controles de importação impostos em julho.

Outro crítico da decisão do Japão de liberar a água radioativa foi o Ministério das Relações Exteriores da Coreia do Norte, ainda de acordo com a AFP.

Os pescadores japoneses também expressaram oposição. Cerca de 10 pessoas realizaram um protesto perto de Fukushima ontem (24), enquanto outros 100 manifestantes se reuniram em frente à sede da Tepco em Tóquio.

Já a organização não governamental Greenpeace, que defende causas ambientais, criticou o lançamento da água de Fukushima no oceano numa nota divulgada na terça-feira (22). “A decisão ignora as provas científicas, viola os direitos humanos das comunidades no Japão e na região do Pacífico e não cumpre o direito marítimo internacional. Mais importante ainda, ignora as preocupações do seu povo, incluindo os pescadores”, defende o grupo.

5. O que dizem os especialistas a favor de liberar a água de Fukushima?

Em artigo publicado no site The Conversation em março, os especialistas em ciência nuclear e química Nigel Marcas, da Universidade Curtin, na Austrália; Brendan Kennedy, da Universidade de Sydney; e Tony Irwin, da Universidade Nacional Australiana, consideram que os perigos do trítio não são altos.

“As autoridades japonesas não planejam libertar a água de uma só vez”, escrevem os professores. “Em vez disso, apenas 0,06g de trítio está programado para lançamento a cada ano. Comparada com a radioatividade já presente no Pacífico, a libertação anual planejada é literalmente uma gota no oceano.”

Jim Smith, professor de ciências ambientais da Universidade de Portsmouth, na Inglaterra, concorda que o trítio não apresenta perigo. Mais que isso: ele afirma que a água tritiada reduz o impacto ambiental, pois é “quimicamente idêntica à água normal”, passando pelos organismos sem se acumular em seus corpos.

“A água tritiada tem um fator de bioacumulação de cerca de um”, disse o especialista, também no The Conversation. “Isso significa que os animais expostos teriam aproximadamente a mesma concentração de trítio nos seus corpos que a água circundante. Em comparação, o césio radioativo 137, liberado em abundância depois do acidente de Fukushima e da central nuclear de Sellafield, no Reino Unido, nas décadas de 1960 e 1970, tem um fator de bioacumulação em ambientes marinhos de aproximadamente 100”, avalia.

Fonte: Revista GALILEU