Pesquisadores da Escola de Enfermagem (EE) da USP participaram da elaboração do livro Ética em pesquisas em epidemias e pandemias: um livro de casos, de acesso aberto, organizado pela Rede Internacional de Pesquisadores Epidemics Ethics – Centro Colaborador para Bioética da Organização Mundial da Saúde (OMS). A publicação reúne casos e comentários de pesquisadores de uma rede mundial de mais de 100 países, que tratam dos desafios éticos e práticos relacionados à investigação em saúde pandêmica. O material está disponível gratuitamente no site do casebook.
O capítulo destinado aos pesquisadores brasileiros foi o Caso 9.5: Ensaios Clínicos COVID-19: Participantes do Grupo Placebo e o Direito de Acesso ao Produto Experimental . “O texto trata da problemática do não fornecimento imediato da vacina de covid-19 aos participantes do estudo clínico, devido ao confisco do imunizante feito pelo Governo Federal de Jair Bolsonaro, em dezembro de 2020”, relata Rafael Rodrigo da Silva Pimentel, um dos autores do capítulo, doutorando da EE e professor da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein. Os outros dois autores foram o professor Marcelo José dos Santos (orientador) e Edson Silva dos Santos, ambos da EE.
Pimentel lembra que logo após a realização das pesquisas de ensaios clínicos que demonstraram a eficácia das vacinas experimentais, o Governo Federal estabeleceu um plano nacional de imunização contra a covid e solicitou que todas as doses fossem disponibilizadas para imunização do grupo prioritário na fase inicial da campanha, o que impactou na capacidade das instituições que faziam as pesquisas em oferecer as vacinas aos voluntários do grupo placebo.
O pesquisador explica que as etapas de desenvolvimento de uma vacina são bem complexas: a primeira corresponde à pesquisa básica, onde são identificadas novas propostas de vacinas; na segunda, são feitos testes pré-clínicos (in vitro, com células, e ou in vivo, em animais) para demonstrar a segurança e o potencial do imunizante de provocar resposta imunológica no organismo; e na terceira etapa, acontecem os ensaios clínicos, a mais longa e mais cara fase da pesquisa, onde são testadas a eficácia da vacina para obtenção do registro sanitário e posterior disponibilização à população.
O texto tratou de questões éticas envolvidas na última fase de estudos clínicos, no qual se discutiu “a importância de se fornecer ao grupo controle que recebeu apenas placebo (substâncias sem propriedades farmacológicas) o direito de ser imunizado com a vacina que estava sendo avaliada e testada, que na ocasião estava sendo administrada apenas ao grupo experimental (que recebia a intervenção). “Estávamos em plena pandemia e era essencial que os voluntários do grupo que receberam apenas placebo também fossem imunizados para protegê-los contra a covid-19 e para a redução da propagação do vírus”, diz.
“Felizmente, mesmo com o confisco, os voluntários que participaram do estudo do grupo que receberam apenas placebo foram imunizados duas semanas depois de resolvido a problemática do confisco”, diz o pesquisador.