Animais marinhos estão ingerindo microplásticos nas profundezas da Antártida há pelo menos quatro décadas, segundo um estudo liderado por cientistas do Instituto Oceanográfico (IO) da USP. Os pesquisadores investigaram o conteúdo gastrointestinal de mais de uma centena de organismos coletados de águas profundas do Oceano Austral entre 1986 e 2016, e encontraram microdetritos em quase um terço deles — incluindo fibras de diversos materiais plásticos, como poliamida, poliéster e polietileno.
Um dos achados do estudo é o registro mais antigo da presença de microplásticos no ambiente antártico: uma fibra azul de pouco mais de 2 milímetros, encontrada nas vísceras de um misidáceo (um crustáceo pequeno, parecido com um camarão), coletado em fevereiro de 1986, ao largo da Península Antártica. O fragmento era feito de polisulfona, um polímero plástico resistente a altas temperaturas e muito usado em revestimento de fiações elétricas e de encanamentos, o que levanta a hipótese de que ele seja oriundo de materiais usados na construção das várias estações de pesquisa que existem na região.
O trabalho, publicado em 20 de novembro na revista científica Environmental Science & Technology, reforça uma percepção já bem caracterizada por outros estudos, de que a Antártida, apesar da baixa ocupação e da distância que a separa dos grandes centros urbanos do mundo, não está imune à poluição humana — nem mesmo no fundo do mar. “A ocorrência de fibras na margem continental mais remota do mundo renova as preocupações com a poluição em regiões aparentemente isoladas”, escrevem os pesquisadores.