Biólogos investigam a possibilidade de sobrevivência de espécies diante do aquecimento do Planeta

A migração é um comportamento natural dos animais, que viajam de um habitat para outro em busca de comida, para reprodução ou para encontrar melhores condições de vida. Cientistas vêm alertando que, com o aquecimento global, muitas espécies estão viajando para regiões mais frias e com climas compatíveis à sua sobrevivência. Um estudo liderado por Agustín Camacho, da Universidade de Madri – e com participação de pesquisadores do Instituto de Biociências (IB) da USP – desvenda conexões importantes entre a tolerância térmica e os limites geográficos das espécies em todo o mundo.

A partir de informações sobre a distribuição de uma determinada espécie no Planeta, juntamente com os dados climáticos que ali existiam, Camacho encontrou uma variável, chamada de Temperatura Voluntária Máxima (Tmáx), que mostra os níveis suportáveis de calor para os animais. Para isso, foram compiladas 2350 medições dos índices de tolerância à temperatura das espécies e da Tmáx correspondente, medidos em diferentes micro-habitats. A tolerância ao calor dos animais restringe os limites geográficos de forma mais forte para espécies com maiores desafios térmicos, ou seja, mais expostas a altas temperaturas. Por outro lado, os fatores que desvinculam a tolerância ao calor e à Tmáx devem ser mais importantes para espécies menos desafiadas termicamente.

“Cada espécie tem uma Temperatura Voluntária Máxima [o máximo que tolera voluntariamente]. Com as medidas, queria tentar definir qual seria o máximo que elas aguentariam de aumento”, explica Camacho. Uma gama de medidas de tolerância identificou quais eram as populações mais conhecidas de cada espécie e quais são as temperaturas mais altas que suportam.

Experimentos laboratoriais foram realizados na Universidade do Arizona com objetivo de testar se o parâmetro, a Tmáx, poderia ser utilizado e traria algum resultado concreto. Na Serra da Capivara (PI) e em Moçambique, especialistas em taxonomia realizaram a coleta de dados. Com os resultados obtidos, os cientistas compararam a tolerância térmica com a temperatura máxima dos locais onde essas populações podem viver e viram como o aquecimento global poderia afetar sua sobrevivência de maneira direta.

“Foi com base nesses dados que foram obtidos em campo que ele conseguiu comparar a eficiência dos parâmetros que são usados na literatura, como a temperatura máxima”, quando o animal se aproxima da morte, aponta o professor Miguel Trefaut Rodrigues, do IB – orientador da pesquisa. Com esses experimentos, Camacho conseguiu dados comparáveis com os já mostrados na literatura.

Foram utilizadas as mesmas especificações para correlacionar os diferentes índices de temperatura máxima entre eles. Para as espécies terrestres, as relações são fortemente lineares, enquanto para as espécies marinhas as diferenças entre a Tmáx média e superficial da água mudam conforme os limites térmicos geográficos ficam cada vez mais quentes.

Camacho ressalta a solidez do estudo e dos dados apurados. “Encontramos o mesmo padrão ou muito próximo da verdade. Algumas espécies têm a tolerância ao aumento das temperaturas como forma de sobrevivência, enquanto outras não. As medidas definem se elas correm risco ou não diante do aumento das temperaturas”.

Questionado pelo Jornal da USP sobre em qual ambiente acredita que o maior número de espécies irá sobreviver, Camacho diz que, tanto no mar quanto na terra, teremos espécies que serão muito afetadas. “As análises são feitas caso a caso, alguns autores dizem o mar”. No entanto, ele discorda. “No mar a dispersão das espécies é maior, enquanto na terra essa dispersão é bem reduzida”, afirma o pesquisador.

Uma decorrência desse estudo é a determinação desse parâmetro de distância térmica e quais espécies estão em perigo. Países preocupados com a preservação ambiental podem usar medidas e aplicar ao máximo de espécies e definir quais estão vulneráveis às mudanças climáticas. “As alterações climáticas não respeitam e muito provavelmente não vão respeitar os limites políticos e geográficos que nós determinamos para área de conservação para preservar algumas espécies”, afirma Miguel Trefaut.