Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil tem a população mais ansiosa do mundo, seguido de Paraguai, Noruega, Nova Zelândia e Austrália. Cerca de 9,3% dos brasileiros sofrem do transtorno de ansiedade patológica que, quando não tratado, pode desencadear outros transtornos mentais, como a depressão, que atinge 300 milhões de pessoas no mundo, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Hoje, a ansiedade é um problema de saúde pública global.
Tanto a depressão quanto a ansiedade tiveram um aumento de 25% mundialmente em decorrência da pandemia. O Brasil entra coroado nessa lista por alguns motivos, considerando o fato de que o País normalmente tem índices elevados de problemas como depressão e ansiedade. Porém, não são apenas desemprego e problemas com a segurança pública que desencadeiam esse aumento.
“O que você tem no Brasil é um bom sistema de epidemiologia pública de coleta de dados, então os dados são bastante confiáveis, e uma população muito aberta para conversar de problemas emocionais”, diz Márcio Bernik, psiquiatra e coordenador do Programa de Transtornos de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Isso pode ser o motivo pelo qual o País aparece em primeiro lugar no ranking de países mais ansiosos.
“Houve um aumento brutal importante de sintomatologia psiquiátrica em geral, especialmente aquelas ligadas a stress, que são os transtornos de ansiedade e depressão, de 2020 para cá”, diz o psiquiatra. Para ele, começamos a entrar agora na terceira onda de aumento de problemas mentais, consequência da pandemia.
Como as pessoas enfrentam esses problemas?
“Um estudo realizado na Suíça, que acompanhou 10.000 jovens durante 30 anos, mostrou que quatro em cada cinco quadros de depressão, na vida adulta ou no início da vida adulta, geralmente surgiram de um transtorno de ansiedade não tratado ou maltratado”, lembra o psiquiatra. Se o transtorno de ansiedade é uma forma de adaptação ruim ao stress crônico, a depressão é a falência dos mecanismos de enfrentamento de estresse. Bernik ainda explica que a pandemia foi um período chamado de tempestade perfeita e ele enumera os motivos: as pessoas não buscaram por ajuda e tratamento por medo de se contaminarem, além de novos casos não tratados e tratamentos não continuados; existem poucos serviços de saúde mental e nenhum ambulatório psiquiátrico no País; o aumento do stress psicossocial, por conta das notícias diárias de pessoas morrendo, adoecendo, com medo de perder emprego e aumento da criminalidade.
“Não dá para fingir que o problema não existe. Não dá para imaginar que a pessoa vai resolver sozinha”, diz o médico. Não há remissão espontânea da ansiedade e da depressão, caso a pessoa não procure tratamento, ela não vai melhorar. “Não é falta de coragem moral da pessoa, não é uma fraqueza de caráter”, ele explica. Ele ainda chama atenção para o Distress Disability Disadvantage, os três Ds, que ajudam a entender e diagnosticar os problemas: o distress é o sofrimento excessivo; disability é a incapacidade de enfrentar o mundo como ele é; e disadvantage é o sentimento de desvantagem em uma empresa ou faculdade, porque a pessoa não consegue falar ou expressar o que sente e a qualidade de seu trabalho cai.
“Dentro desse contexto, você precisa buscar ajuda, que passa por uma avaliação psiquiátrica, ou pelo menos uma unidade básica de saúde com um médico. O tratamento não é obrigatoriamente um tratamento com medicamentos, você pode optar em muitos casos por uma terapia comportamental cognitiva, um medicamento e, sempre que possível, também psicoterapia”, diz Bernik.