Cientistas reativam células sensíveis à luz em olhos de pessoas mortas

Seria possível trazer um ente querido falecido de volta à vida? Apesar de parecer coisa de ficção científica, cientistas se aproximaram dessa possibilidade: em um novo estudo, eles “ressuscitaram” células nervosas em olhos de cadáveres, restaurando a comunicação entre elas. Os resultados foram publicados em 11 de maio na revista Nature.

Momentaneamente, um leve “brilho de vida” tomou conta das células moribundas, retiradas de doadores de órgãos. Os pesquisadores trabalharam com células fotorreceptoras, isto é, com estruturas sensíveis à luz, obtidas do Banco de Olhos do Lions de Utah, além do Banco de Olhos de San Diego e da sociedade de doadores de órgãos LifeSharing, nos Estados Unidos.

Segundo Fatima Abbas, principal autora do estudo, a equipe conseguiu despertar novamente células de uma parte da retina responsável pela visão central e a capacidade de ver cores e detalhes. “Em olhos obtidos até cinco horas após a morte de um doador de órgãos, essas células responderam à luz brilhante, luzes coloridas e até mesmo flashes de luz muito fracos”, conta a pesquisadora, em comunicado.

Inicialmente, foi possível reviver os fotorreceptores, mas não manter a capacidade deles de se comunicar com outras células da retina. Os pesquisadores, que atuam na Universidade de Utah e na Scripps Research, notaram então que essa perda se dava devido à privação de oxigênio.

Para contornar o problema, Anne Hanneken, professora associada de pesquisa da Scripps, adquiriu olhos de doadores de órgãos que haviam morrido há menos de 20 minutos. Enquanto isso, Frans Vinberg, cientista do Moran Eye Center, projetou um aparato para restaurar a oxigenação e outros nutrientes dos olhos doados, construindo também um dispositivo para estimular a retina e medir a atividade elétrica de suas células.

A partir da retina, a equipe restaurou após a morte, pela primeira vez, um sinal elétrico específico visto em olhos vivos: a “onda b”. “Conseguimos fazer as células da retina falarem umas com as outras, da mesma forma que fazem no olho vivo para mediar a visão humana”, afirma Vinberg, acrescentando que estudos anteriores restauraram a atividade elétrica de modo muito mais limitado.

O novo estudo foi bastante amplo, fornecendo dados de mais de 40 olhos de doadores humanos. A pesquisa resultou ainda na primeira descrição de um mecanismo que deve limitar a velocidade da visão central humana. Para Vinberg, a abordagem poderá reduzir os custos de pesquisa em comparação com estudos feitos em modelos animais.