A decisão da Suprema Corte do Equador, de abril deste ano, de permitir a interrupção da gravidez a todas as mulheres vítimas de estupro chamou atenção para o sofrimento vivido por meninas e adolescentes que sofrem abusos sexuais, muitas vezes nas mãos de seus próprios familiares. “Ninguém vê, ninguém ouve e as montanhas nunca falam.” Assim uma dessas vítimas encerra a entrevista, olhando para a cordilheira dos Andes em silêncio. A conversa havia começado 40 minutos antes, com o acordo sobre qual seria seu nome fictício. “Sarita”, diz ela. Sara ou Sarita? “Sarita”.
Embora o uso do diminutivo seja comum na serra do Equador, parece estranho usá-lo para falar de uma mulher que cria quatro filhos sozinha. O primeiro foi fruto de um estupro, os dois do meio são filhos de uma relação que terminou recentemente e o último foi dado à luz pela irmã mais nova de Sarita, estuprada pelo mesmo agressor. É fácil esquecer que ela não tem mais de 25 anos, mas deixou de habitar aquele território infantil a que pertence o diminutivo aos 10 anos de idade, quando o padrasto dela a estuprou pela primeira vez.