“Vamos ter a 1ª planta do Brasil para produzir Combustível Sustentável de Aviação”, diz pesquisadora do ISI-ER sobre projeto desenvolvido no RN

“Aqui no Instituto SENAI, no Nordeste do Brasil, vamos ter a primeira planta de produção de SAF (Combustível Sustentável de Aviação) do país”. A pesquisadora Fabiola Correia mirou especialistas brasileiros/as e estrangeiros/as na última quarta-feira (18) e sintetizou, com essa frase, os rumos esperados com o trabalho que está coordenando, no Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER), em Natal, para chegar a um combustível sintético, capaz de reduzir as emissões de gases do efeito estufa no transporte aéreo brasileiro.

O projeto de produção de Combustível Sustentável de Aviação é executado por meio de parceria entre o SENAI e a Cooperação Técnica Alemã para o desenvolvimento sustentável (na sigla alemã GIZ – Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit), com o apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e participação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Detalhes técnicos da iniciativa foram apresentados pela pesquisadora na palestra “Produção de Combustível Sintético de Aviação pela rota Fischer-Tropsch”, do 2º Congresso da Rede Brasileira de Bioquerosene e Hidrocarbonetos Sustentáveis para Aviação (RBQAV).

O evento foi realizado durante três dias, na capital, e encerrado na quarta-feira. Processos químicos, rotas tecnológicas de produção, intercâmbio de conhecimentos entre as instituições envolvidas e infraestrutura para o desenvolvimento do novo combustível foram esmiuçados na palestra de Fabiola.

Produzir um querosene sintético renovável, a partir da glicerina, é o objetivo da equipe de pesquisadores/as. A produção, explicou Fabiola, se dará por meio de um processo químico denominado rota Fischer-Tropsch.

A glicerina, que é um co-produto do biodiesel e abundante no Brasil, será transformada em gás de síntese (monóxido de carbono e hidrogênio verde) e, após processos químicos e industriais, será transformada em combustível. “A ideia é obter um produto já certificado para o mercado da aviação”, disse a pesquisadora.

Como a produção é sustentável, a expectativa é que o combustível colabore com a redução das emissões de CO2 – um dos principais gases do efeito estufa – e com o alcance de metas ambientais do Brasil.

Projeto

O projeto terá duração de dois anos, período em que os pesquisadores também deverão estimar quando o novo combustível poderá chegar ao mercado (Clique aqui para ver mais detalhes no texto “SENAI produzirá combustível sustentável de aviação no RN com apoio da Cooperação Alemã”).

A iniciativa receberá mais de R$ 4,5 milhões em investimentos até 2023 para obras de adaptação dos reatores e dos equipamentos já existentes na sede do Instituto SENAI, no Rio Grande do Norte, para a produção da solução.

“O projeto contempla uma unidade de produção de SAF (o combustível Sintético), que vai nos gerar em torno de 5 litros/dia de QAV (Querosene de Aviação) sustentável”, acrescentou Fabiola na palestra, relembrando que a ideia chegou a ser apresentada três anos atrás, no mesmo Congresso, e que agora está se concretizando.

“Nós vamos chegar nesse produto. Vamos conseguir chegar no SAF para abastecer aviões. E esse é o nosso primeiro passo”, frisou a pesquisadora.

O pesquisador líder do Laboratório de Sustentabilidade do ISI-ER, o engenheiro e doutor em Química, Juan Ruiz, o técnico de laboratório do Instituto na área de automação, manutenção, instrumentação e controle de processos, Ciro Lobo, além de Carlos Padilha, Luanna Paiva e Giovanny Oliveira, pesquisadores/as bolsistas nas áreas de Engenharia Química e Engenharia do Petróleo também integram o projeto.

Emissões

Dados do Plano de Ação para a Redução das Emissões de CO2 da Aviação Civil Brasileira, publicado em 2018 pelo Ministério da Infraestrutura, mostram que o consumo de combustível na aviação cresceu, no país, a uma taxa média anual de 2,90% para os voos domésticos e 1,74% para os internacionais, entre os anos 2000 e 2018.

O mesmo documento aponta, a partir de análise da Agência Internacional de Energia (AIE), que as metas mundiais de redução de gases de efeito estufa não serão atingidas sem o aumento expressivo do consumo de biocombustíveis.

O setor de aviação contribui com 2% das emissões globais de CO2 – um dos principais gases causadores do efeito estufa – segundo a Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA). No Brasil, trabalho publicado pela Universidade Federal do Paraná, a partir de informações do MCTI, estima que 1,8% das emissões derivadas dos combustíveis são atribuídas ao setor.

Mudanças

“Nós temos que reduzir nossas emissões. Precisamos de mudanças radicais na aviação e no setor energético”, ressaltou Jürgen Kern, pesquisador e gerente de Projetos do Departamento de Análise de Sistemas de Energia do Centro de Pesquisas Aeroespaciais da Alemanha (DLR), no mesmo painel em que a pesquisadora do ISI-ER apresentou o projeto com a GIZ.

O DLR também investiga e desenvolve tecnologias para alcançar um patamar de aviação sem impactos climáticos, com 0% de emissões. Aeronaves com células de combustíveis e aviões elétricos estão entre elas.

O especialista defende os combustíveis sustentáveis como “excelentes opções”, mas não como soluções únicas. “É preciso pensar também em outras alternativas, em outras tecnologias, para oferecer soluções para o futuro”, disse.

Na visão dele, não há mais tempo a perder nesse campo. “A jornada é longa, e é preciso começar a caminhar, com estratégias claras para que os investimentos aconteçam.

Tina Ziegler, diretora do projeto Combustíveis Alternativos sem Impactos Climáticos (ProQR), da GIZ, no Brasil, e mediadora do painel, também destacou a importância de mudanças rápidas e perguntou: “o que precisa no Brasil para ter aviação limpa de forma segura e prática?”.

Para Kerne, o país deve investir em diferentes soluções e agir. “Não temos tempo para apenas fazer planos. Nós temos que adaptar os planos enquanto caminhamos”, frisou ele.

O consultor alemão na área de biocombustíveis, Dietmar Posselt, também participou do painel e afirmou que o Brasil tem boas bases para começar.

Tina fez coro. “O Brasil já se posicionou internacionalmente como pioneiro na área de biocombustíveis e agora tem tudo para fazer isso acontecer também nessa nova frente: em academia capacitada, a indústria pronta e demanda”.

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